Alderi Souza de Matos
Quem visita o Cemitério dos Protestantes, localizado na Rua Sergipe, 177, no bairro do Higienópolis, em São Paulo, logo percebe estar num cemitério diferente. Apesar de ser um cemitério antigo, fundado em 1858, o local é aprazível e bem cuidado. As calçadas são limpas, a maior parte dos túmulos tem boa conservação, muitas plantas e flores são vistas por toda parte. Existem diversas árvores, algumas das quais têm bebedouros para os passarinhos, especialmente os colibris. Durante quase todo o dia, ouve-se a algazarra alegre de centenas de aves, que ali se sentem à vontade no meio da imensa metrópole. Grande parte das sepulturas ostenta nomes estrangeiros. Lembram pessoas que vieram de outras partes do mundo e fizeram do Brasil a sua pátria. Muitas lápides refletem as convicções evangélicas dos falecidos, sua fé em Deus, a certeza da salvação em Cristo, a esperança da ressurreição.
Para os presbiterianos brasileiros, o Cemitério dos Protestantes tem grande valor sentimental e histórico. Nenhuma outra necrópole abriga os restos mortais de tantos personagens ilustres da nossa história. Para citarmos alguns exemplos, logo à entrada, no lado esquerdo da calçada principal, podemos ver o nome do Rev. Modesto Perestrello Barros de Carvalhosa; um pouco adiante, encontramos as lápides de Eduardo Carlos Pereira e Zacarias de Miranda; próximos ao muro esquerdo estão Vicente Temudo Lessa e Filipe Landes; na extremidade direita, deparamo-nos com os nomes de Emanuel Vanorden e Manoel Antônio de Menezes. Todavia, a seção central ao fundo do terreno é um lugar especialmente significativo. Ali, numa pequena área de cerca de 20 m², estão os túmulos de Ashbel Green Simonton, sua irmã Elizabeth Simonton, José Manoel da Conceição, Francis J. C. Schneider, Horace Manley Lane, William Alfred Waddell, Benjamin Harris Hunnicutt e diversos membros da família do Rev. John Benjamin Kolb. É oportuno conhecermos um pouco da história desses e de outros vultos notáveis.
Como já foi apontado no outro texto sobre essa matéria, os presbiterianos sepultados no Cemitério dos Protestantes podem ser classificados em três categorias: (a) missionários estrangeiros e pastores nacionais; (b) familiares dos missionários e pastores; (c) oficiais e membros das igrejas de São Paulo. Vejamos alguns dos nomes mais relevantes dessas categorias, por ordem cronológica de falecimento.
1. Missionários e pastores:
Ashbel Green Simonton (1833-1867) – missionário fundador da Igreja Presbiteriana do Brasil; chegou ao Rio de Janeiro em 12 de agosto de 1859 e dois anos e meio mais tarde fundou a igreja presbiteriana daquela cidade; foi uma das primeiras pessoas a serem sepultadas no Cemitério dos Protestantes.
José Manoel da Conceição (1822-1873) – ex-sacerdote que ingressou na Igreja Presbiteriana e tornou-se o primeiro pastor evangélico brasileiro; a data da sua ordenação, 17 de dezembro de 1865, é o dia do pastor presbiteriano; suas viagens evangelísticas deram origem a muitas igrejas.
Elizabeth Wiggins Simonton (1822-1879) – irmã de Ashbel G. Simonton e esposa do Rev. Alexander L. Blackford; foi a primeira missionária presbiteriana a vir para o Brasil, em 1860; contribuiu para a conversão de José Manoel da Conceição.
Francis Joseph Christopher Schneider (1832-1910) – natural da Alemanha, veio para o Brasil a fim de trabalhar entre os imigrantes alemães; foi o pioneiro presbiteriano no interior de São Paulo e na Bahia; organizou a Igreja de Salvador.
Horace Manley Lane (1837-1912) – médico e educador, foi o fundador e o primeiro presidente do Mackenzie College; cooperou com a reforma da educação no Estado de São Paulo; incentivou a obra missionária no Vale do Ribeira.
Emanuel Vanorden (1839-1917) – judeu holandês; como proprietário de uma livraria e editora, muito fez pela literatura evangélica; fundou a primeira igreja presbiteriana no Rio Grande do Sul, na cidade de Rio Grande.
Modesto Perestrello Barros de Carvalhosa (1846-1917) – natural da Ilha da Madeira, foi um dos primeiros membros da Igreja Presbiteriana de São Paulo e um dos quatro alunos do “seminário primitivo”, no Rio de Janeiro; trabalhou por muitos anos na Escola Americana e no Mackenzie; pastoreou as igrejas de Campos, Curitiba e Unida de São Paulo (primeiro pastor).
Eduardo Carlos Pereira (1855-1923) – pastoreou a Igreja Presbiteriana de São Paulo por 35 anos; idealizou a Sociedade Brasileira de Tratados Evangélicos, o Plano de Missões Nacionais, o Instituto Teológico e o periódico O Estandarte; fundou a Igreja Presbiteriana Independente; foi renomado gramático.
José Zacarias de Miranda e Silva (1851-1926) – foi pastor em Brotas, São Paulo, São João da Boa Vista, Campinas e especialmente em Sorocaba; era conhecedor da música e tornou célebre o coral da Igreja de Sorocaba.
William Alfred Waddell (1862-1939) – pastor e engenheiro, chegou ao Brasil em 1890; dirigiu a construção do primeiro edifício do Mackenzie College e foi o terceiro presidente da instituição; criou célebre escola em Ponte Nova (Wagner), no interior da Bahia; fundou o Instituto José Manoel da Conceição, em Jandira, São Paulo.
Roberto Frederico Lenington (1871-1939) – nasceu em Rio Claro (SP), filho do Rev. Robert Lenington; foi missionário no Paraná e em Santa Catarina; organizou as igrejas de São Francisco do Sul e Florianópolis; lecionou no Instituto José Manoel da Conceição e no Seminário de Campinas.
Vicente Themudo Lessa (1874-1939) – natural de Pernambuco; exerceu o seu ministério em várias cidades paulistas e em São Luiz do Maranhão; um dos fundadores da Igreja Presbiteriana Independente; professor do Instituto José Manoel da Conceição; primeiro historiador do presbiterianismo brasileiro.
Manoel Antônio de Menezes (1848-1941) – português da Ilha da Madeira e antigo membro da Igreja do Rev. Kalley, no Rio de Janeiro; estudou em Londres e foi pastor em Lisboa; no Brasil, pastoreou igrejas no Rio Grande do Sul, Vale do Paraíba e sul de Minas; apreciado compositor de hinos.
Bento Dias Ferraz de Arruda (1865-1944) – pastor, advogado e professor; trabalhou em Dois Córregos, Caldas, Campinas, Rio de Janeiro e São Paulo; um dos fundadores da Igreja Presbiteriana Independente; fundador da Igreja Presbiteriana Conservadora.
Eduardo Pereira de Magalhães (1908-1959) – neto do Rev. Eduardo Carlos Pereira; líder da mocidade evangélica brasileira.
Benjamin Harris Hunnicutt (1886-1962) – agrônomo e missionário; organizou a Escola Agrícola de Lavras, ligada ao Instituto Gammon; foi o quinto presidente do Mackenzie.
Filipe Sheeder Landes (1883-1966) – filho do pioneiro George Anderson Landes; implantou o presbiterianismo nas regiões norte e sul de Mato Grosso; foi professor do Seminário de Campinas.
Boanerges Ribeiro (1919-2003) – fundador da Casa Editora Presbiteriana e do Seminário Rev. José Manoel da Conceição; presidente do Instituto Mackenzie, presidente do Supremo Concílio da IPB (1966-1978), autor de livros sobre a história do protestantismo e do presbiterianismo no Brasil.
2. Familiares de missionários e pastores:
Mary Elizabeth Lenington Waddell (1866-1893) – filha do Rev. Robert Lenington; professora da Escola Americana; primeira esposa do Rev. Dr. William Alfred Waddell.
Louise Pereira (1858-1923) – nascida em Genebra, Suíça; professora da Escola Americana; esposa do Rev. Eduardo Carlos Pereira.
Keziah Brevard Kolb (1857-1940) – filha do Dr. James McFadden Gaston, médico e presbítero que residiu em Campinas; esposa do Rev. John Benjamin Kolb.
Laura Chamberlain Waddell (1869-1943) – filha primogênita do Rev. George Whitehill Chamberlain; segunda esposa do Rev. William Alfred Waddell.
Kenneth Chamberlain Waddell (1898-1959) – médico e engenheiro, filho de William e Laura Waddell; foi missionário na Bahia.
Ida Eloise Kolb (1890-1959) – filha do Rev. John Benjamin Kolb; lecionou na Escola Americana de Curitiba; foi diretora da Escola Americana de São Paulo e do Internato Feminino do Mackenzie.
3. Membros das igrejas de São Paulo:
Remígio de Cerqueira Leite (1858-1904) – sobrinho do Rev. Antônio Pedro de Cerqueira Leite; professor da Escola Americana; diácono e presbítero da Igreja Presbiteriana de São Paulo; devotado simpatizante do Rev. Eduardo Carlos Pereira.
Isidro Bueno de Camargo (1845-1911) – presbítero da Igreja Presbiteriana de São Paulo.
Joaquim Alves Corrêa (1863-1933) – presbítero da Igreja Presbiteriana de São Paulo; um dos fundadores do jornal O Estandarte.
Eliézer dos Santos Saraiva (1879-1944) – engenheiro civil; filho do ex-sacerdote Francisco Rodrigues dos Santos Saraiva; superintendente da Escola Dominical da Igreja Unida de São Paulo; secretário geral da União Sul-Americana do Esforço Cristão.
Rubens Escobar Pires (1906-1978) – médico; diácono da 1ª Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo; dirigiu por quarenta anos a Policlínica Bom Samaritano, da Associação Evangélica Beneficente.
Flamínio Fávero (1895-1982) – médico; professor de medicina legal na Universidade de São Paulo e na Faculdade de Direito do Mackenzie; membro da 1ª Igreja Presbiteriana Independente; escritor e conferencista evangélico; genro do Rev. Bento Ferraz.
Carmen Escobar Pires (1897-1984) – cirurgiã-obstetra e professora de medicina; prestou serviços médicos à Associação Evangélica Beneficente por mais de trinta anos; presidente da Associação Paulista de Medicina e do Colégio de Cirurgiões do Brasil; diaconisa da 1ª Igreja Presbiteriana Independente.