No transcurso dos 165 anos da chegada do Rev. Ashbel G. Simonton (12.08.1859) e, consequentemente, da trajetória da Igreja Presbiteriana do Brasil, é importante conhecer trechos seletos de alguns dos documentos mais importantes dessa história. Esses textos são valiosos pelo seu alto significado e por permitirem um contato direto com as fontes da nossa história. Alguns deles já foram publicados e outros são inéditos.
Os primeiros textos significativos são algumas anotações do Diário de Simonton em que o pioneiro reflete sobre sua decisão de ser missionário no Brasil. Após concluir os estudos secundários, o jovem havia trabalhado por breve tempo como professor no sul dos Estados Unidos. Regressando ao seu estado natal, a Pensilvânia, ele recebeu a influência de um avivamento e ingressou no Seminário de Princeton, em Nova Jersey (1855). Ainda no início dos estudos, ao ouvir o sermão de um professor, sentiu o desejo de ser missionário no exterior. Algum tempo depois, fez os seguintes registros no seu diário:
10 de outubro de 1857
Por mais de um ano tenho tido em mente a possibilidade de trabalhar como missionário. Quando a ideia surgiu pela primeira vez, resolvi pensar seriamente em oração, e adiar a decisão até perto do final do curso. Como esse final está chegando, a questão pesa cada vez mais sobre mim e, se fosse possível, gostaria de vê-la decidida… O Dr. [John Leighton] Wilson (da Junta de Missões Estrangeiras) esteve no meu quarto e, conversando sobre missões, dei-lhe fortes razões para crer que logo oferecerei formalmente os meus serviços à Junta… Meus sentimentos a respeito desse trabalho já são menos inquietos agora do que quando a decisão estava longe. No que depende de mim, estou pronto para partir, e sinto, mais do que nunca, ser este o caminho de meu dever.
27 de novembro de 1858
Finalmente o passo decisivo foi dado. No dia 25 enviei minha proposta formal à Junta de Missões Estrangeiras. Mencionei o Brasil como o campo no qual estou mais interessado, mas deixei à Junta a decisão final. Irei só. Assim, a incerteza que vem me oprimindo há um ano finalmente terminou. A mão da Providência evidentemente pode ser vista nisto. A ti, ó Deus, confio meus caminhos na certeza de que tu dirigirás meus passos retamente.
Em sua reunião de maio de 1859, a Assembleia Geral da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos da América (PCUSA) aprovou a resolução transcrita adiante, como parte do Relatório da Junta de Missões Estrangeiras, sediada em Nova York. Com isso, Simonton obteve a aprovação formal de sua igreja para o trabalho missionário no Brasil. Não mais se tratava simplesmente de um projeto pessoal, mas algo endossado por sua denominação. São muito interessantes as justificativas apresentadas para o trabalho missionário no novo campo estrangeiro. A resolução dizia o seguinte:
Proposta de Missão no Brasil
Já há algum tempo que a comunidade cristã tem tido sua atenção voltada para o Brasil como campo atraente de trabalho missionário, com apelo especial às igrejas evangélicas deste país. O território brasileiro é mais vasto que o nosso; o clima é igualmente variado e saudável; o solo se presta tanto a produtos de clima temperado como de clima tropical; a população ainda é relativamente pequena; os recursos, ricos e vários, ainda estão em grande parte inexplorados. Mas há forças em ação, tanto na Europa como no Brasil, que rapidamente atraem ao último grande número de imigrantes. Provavelmente não está longe o dia em que o Brasil terá seu lugar entre as nações mais importantes da Terra em população e nos outros elementos de grandeza nacional. É de alta importância para seu presente e para seu bem-estar futuro, que a mente nacional esteja imbuída de ideias e princípios religiosos corretos, e estes deverão proceder, em primeiro lugar, das igrejas evangélicas de nosso país. Talvez jamais tenha havido época mais oportuna do que esta para agirmos. É certo que o catolicismo romano é a religião oficial do país, mas o governo é liberal, e também o é grande parte das classes mais inteligentes; ao mesmo tempo, a tolerância religiosa é garantida por textos legais. É também digno de nota que a primeira tentativa de colonizar o país foi de um grupo huguenote, obrigado a deixar a pátria pela perseguição religiosa, mais ou menos na mesma época em que os dissidentes ingleses e escoceses encontravam asilo aqui.
Já foi nomeado um missionário, o Rev. A. G. Simonton, membro do Presbitério de Carlisle, e há pouco diplomado pelo Seminário Teológico de Princeton. Espera embarcar para esse novo campo missionário no começo do verão. Sem dúvida a missão será um tanto experimental. Seus primeiros objetivos serão: explorar o território, verificar os meios de atingir com sucesso a mente dos naturais da terra e testar até que ponto a legislação favorável à tolerância religiosa será mantida. Se o resultado dessas investigações for positivo – e temos plenas razões para supor que sim – a missão poderá depois ser ampliada em termos que as circunstâncias justifiquem.
Referências
O Diário de Simonton: 1852-1866. 2ª ed. rev. Editora Cultura Cristã, 2002, p. 109-111; Boanerges Ribeiro, Protestantismo e cultura brasileira. Casa Editora Presbiteriana, 1981, p. 17s.