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Os Sessenta e Sete Artigos de Zuínglio (1523)

Os Sessenta e Sete Artigos foram redigidos pelo reformador Ulrico Zuínglio (1484-1531) para o Primeiro Debate de Zurique, que introduziu formalmente a Reforma Protestante nessa cidade suíça. Preparados inicialmente para essa ocasião, eles são um documento simples e rudimentar, sem a elaboração teológica que marcaria os escritos posteriores desse líder.

Eu, Ulrico Zuínglio, confesso que tenho pregado na nobre cidade de Zurique estes sessenta e sete artigos ou opiniões com base na Escritura, que é chamada theopneustos (isto é, inspirada por Deus). Proponho-me a defender e vindicar esses artigos com a Escritura. Mas se eu não tiver entendido a Escritura corretamente, estou pronto a ser corrigido, mas somente a partir da mesma Escritura.

1. Todo o que diz que o Evangelho é nada sem a sanção da Igreja, erra e blasfema contra Deus.

2. O resumo do Evangelho é que nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Filho de Deus, nos fez conhecer a vontade de seu celestial Pai, nos redimiu da morte e nos reconciliou com Deus por sua inocência.

3. Assim, Cristo é o único caminho para a salvação de todos os que foram, estão agora ou serão salvos.

4. Aquele que buscar ou apontar outras portas erra. De fato, ele é um assassino da alma e um ladrão.

5. Assim, todos os que consideram outros ensinos iguais ou maiores que o Evangelho erram. Eles não sabem o que é o Evangelho.

6. Pois Cristo Jesus é o guia e capitão, prometido por Deus e entregue para toda a raça humana.

7. Ele é uma salvação eterna e o cabeça de todos os crentes, que são seu corpo, o qual é morto e incapaz de fazer algo fora dele.

8. Disto se segue, antes de tudo, que todos os que vivem na cabeça são membros e filhos de Deus. E esta é a igreja ou comunhão dos santos, a noiva de Cristo, a ecclesia catholica.

9. Segue, em segundo lugar, que como os membros físicos são incapazes de fazer qualquer coisa sem a cabeça os gerenciando, assim também é impossível para qualquer um no corpo de Cristo fazer algo sem Cristo, o cabeça.

10. Assim como uma pessoa é demente se os membros de seu corpo fazem algo sem a cabeça, machucando-se, ferindo-se e se prejudicando, assim são os membros de Cristo dementes, espancando-se e sobrecarregando-se com leis insensatas sempre que empreendem algo sem Cristo, seu cabeça.

11. Disto nós vemos que os estatutos dos chamados clérigos, com toda a sua pompa, riqueza, títulos e leis, são a causa de toda loucura, pois eles de forma alguma correspondem ao cabeça.

12. Assim, eles ainda agem loucamente, não por causa do cabeça (pois este anseia no presente tempo produzir o que vem da graça de Deus), mas porque não se permite mais que eles sejam néscios, antes se procura forçá-los a ouvir apenas o cabeça.

13. Sempre que dermos ouvidos à palavra, adquirimos puro e claro conhecimento da vontade de Deus e somos atraídos a ele por seu Espírito e transformados em sua semelhança.

14. Portanto, todos os cristãos devem fazer o máximo para que em todo lugar o evangelho de Cristo seja pregado.

15. Pois a crença no evangelho constitui nossa salvação, e a descrença, nossa condenação, pois toda a verdade está clara nele.

16. No evangelho nós aprendemos que o ensino e os estatutos humanos são de nenhuma utilidade para a salvação.

17. Que Cristo é o único eterno sumo sacerdote, disto nós deduzimos que todo aquele que pretende ser sumo sacerdote se opõe à honra e poder de Cristo; de fato, ele o rejeita.

18. Que Cristo, que se ofereceu uma vez como sacrifício, é um perpétuo e válido pagamento pelo pecado de todos os crentes; disto segue-se que a missa não é um sacrifício, mas um memorial do sacrifício e um selo da redenção que Cristo manifestou a nós.

19. Que Cristo é o único mediador entre nós e Deus.

20. Que Deus quer nos dar todas as coisas em seu nome. Segue-se disto que nós não precisamos fora do tempo presente de outro mediador senão ele.

21. Quando oramos uns pelos outros aqui na terra, nós fazemos confiando que todas as coisas nos são dadas por meio de Cristo somente.

22. Cristo é nossa justiça. Disto nós concluímos que nossas palavras são boas na medida em que elas são as de Cristo; mas na medida em que são nossas, elas não são nem justas nem boas.

23. Cristo rejeita as riquezas e pompas deste mundo. Disto concluímos que aqueles que ajuntam riquezas para si mesmos em seu nome o difamam enormemente já que eles o usam para cobrir sua própria ganância e devassidão.

24. Todo cristão é livre de qualquer uma das obras que Deus não ordenou e lhe é permitido em todos os tempos comer de tudo. Disto nós aprendemos que as dispensações a respeito de queijo e manteiga são uma fraude romana.

25. Os tempos e lugares estão sujeitos aos cristãos, não o contrário; disto nós aprendemos que aqueles que amarram tempos e lugares roubam os cristãos de sua liberdade.

26. Nada desagrada mais a Deus que a hipocrisia. Disto nós aprendemos que tudo o que simula a bondade aos olhos humanos é uma hipocrisia e infâmia total. Isto se aplica a vestimentas, insígnias, tonsuras etc.

27. Todos os cristãos são irmãos de Cristo e entre si; ninguém na terra deveria ser elevado e ser chamado Pai. Isto anula ordens religiosas, seitas e assembleias ilegais.

28. Tudo que Deus permite ou que ele não proibiu é permitido; disto nós aprendemos que é próprio para qualquer um se casar.

29. Que todos aqueles que nós chamamos “espirituais” pecam quando, tendo descoberto que Deus não lhes deu a habilidade de se manter castos, ao contrário não se protegem por meio do casamento.

30. Aqueles que fazem voto de castidade se comprometem infantilmente ou tolamente demais. Nós aprendemos disto que qualquer um que aceite tais votos faz injustiça a boas pessoas.

31. Nenhuma pessoa particular pode impor a exclusão sobre ninguém, exceto a igreja, ou seja, a comunidade daqueles entre os quais aquela pessoa a ser excomungada vive, juntamente com seu guardião, ou seja, o ministro.

32. Somente a pessoa que causa ofensa pública pode ser banida.

33. Possessões obtidas impiamente que não podem ser restituídas a seus donos por direito não devem ser dadas a templos, mosteiros, monges, sacerdotes e freiras, mas ao pobre.

34. A chamada autoridade espiritual não pode justificar sua pompa com base no ensino de Cristo.

35. Mas a autoridade temporal deriva força e afirmação do ensino e obra de Cristo.

36. Toda autoridade judicial e administração da justiça que a propriedade sacerdotal arroga para si, realmente pertence à autoridade temporal na medida em que ela busca ser cristã.

37. Além do mais, todos os cristãos, sem exceção, devem obediência a eles.

38. Todos os cristãos sem exceção devem obediência a eles desde que não ordenem nada que é oposto a Deus.

39. Assim todas as suas leis devem se conformar com a vontade divina, de forma que protejam a pessoa oprimida, mesmo que ela de fato não faça uma acusação.

40. Apenas elas [as autoridades] estão autorizadas a impor a pena de morte e somente sobre aqueles que causam ofensa pública, sem com isto incorrer na ira de Deus, a menos que ele ordene outra coisa.

41. Quando oferecem conselho e justo auxílio àqueles pelos quais devem prestar contas perante Deus, estes por sua vez têm o dever de lhes dar apoio físico.

42. Se eles se tornarem infiéis e não agirem de acordo com os preceitos de Cristo, podem ser depostos em nome de Deus.

43. Em resumo, o domínio de alguém que governa com Deus apenas, é o melhor e mais estável, mas o domínio de alguém que governa por seu próprio capricho é o pior e mais inseguro.

44. Os verdadeiros adoradores invocam a Deus em espírito e verdade, sem qualquer clamor perante o povo.

45. Os hipócritas fazem suas obras para serem vistos pelo povo; eles recebem a sua recompensa neste mundo.

46. Assim, segue que o salmodiar e o alto clamor, sem devoção verdadeira e feito por dinheiro somente, busca o louvor humano ou o ganho material.

47. Uma pessoa deveria sofrer morte física ao invés de ofender ou desgraçar um cristão.

48. Alguém que, por causa de enfermidade ou ignorância, tende a se ofender sem qualquer causa, não deve ser deixado fraco ou ignorante. Ao invés disto, deveria ser fortalecido de forma que não considere como pecaminoso o que não é de maneira nenhuma pecaminoso.

49. Não conheço maior ofensa do que proibir os sacerdotes de ter esposas, permitindo-lhes, no entanto, relacionar-se com prostitutas.

50. Somente Deus perdoa pecados por meio de Jesus Cristo seu Filho, nosso único Senhor.

51. Quem quer que atribua isto a uma criatura rouba Deus de sua honra e a dá a outro que não é Deus. Isto é uma completa idolatria.

52. Então a confissão que é feita a um sacerdote ou a um próximo não pode ser tida como a remissão de pecados, mas simplesmente como uma busca de conselho.

53. A imposição de atos de penitência deriva de conselho humano – com a exceção do banimento. As penitências não removem o pecado e são impostas meramente para dissuadir outros.

54. Cristo suportou toda a nossa dor e fadiga. Assim, quem quer que atribua a obras de penitência o que é de Cristo apenas, erra e blasfema contra Deus.

55. Quem se recusa a perdoar o pecado de uma pessoa arrependida não pode afirmar estar agindo em nome de Deus ou de Pedro, mas no do Diabo.

56. Quem quer que perdoe certos pecados somente por dinheiro é companheiro de Simão e Balaão e o próprio mensageiro do Diabo.

57. As verdadeiras Escrituras Sagradas nada sabem de um purgatório após esta vida.

58. A sentença daqueles que morreram é conhecida apenas por Deus.

59. E quanto menos Deus nos deixa saber sobre isto, menos deveríamos tentar saber sobre tal coisa.

60. Que uma pessoa, por preocupação pelos mortos, peça a Deus para lhes mostrar misericórdia, eu não desaprovo. Mas estipular um tempo para isto e mentir por causa de ganho, não é humano, mas diabólico.

61. As Escrituras nada sabem sobre a forma de consagração que os sacerdotes têm recebido em tempos recentes.

62. As Escrituras não conhecem nenhum outro sacerdote senão aqueles que proclamam a Palavra de Deus.

63. Àqueles que proclamam a Palavra de Deus, as Escrituras nos ordenam mostrar respeito ao lhes dar sustento material.

64. Todos aqueles que confessam seus erros não devem ser forçados a se reconciliar, mas deve-se permitir que morram em paz, e sua herança deve então ser administrada em um espírito cristão.

65. Aqueles que desejam confessar seu erro serão tratados por Deus. Então, nenhuma violência deve ser feita a seus corpos, a menos, é claro, que eles se comportem de forma tão indecorosa que ninguém possa fazer nada sem ela.

66. Todos os superiores clericais devem se humilhar instantaneamente e levantar somente a cruz de Cristo, e não a caixa de dinheiro. Do contrário eles perecerão; o machado é deitado na raiz da árvore.

67. Se alguém desejar discutir comigo taxas de juros, dízimo, crianças não batizadas ou a confirmação, eu me declaro desejoso de responder.

Ninguém aqui empreenda discussões com sofismas ou com insensatez humana, mas que venha para as Escrituras para aceitá-las como o juiz (pois as Escrituras exalam o Espírito de Deus), então que a verdade seja encontrada, ou, se encontrada, como eu espero, seja retida. Amém.

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