Essa pastoral foi publicada pelo moderador do Sínodo (Rev. João Ribeiro de Carvalho Braga) e pelo 1º secretário (seu filho Rev. Erasmo de Carvalho Braga) uma semana após a divisão da igreja com a saída dos independentes.
Amados irmãos,
A graça de nosso Senhor e Mediador Jesus Cristo, o amor de Deus Pai e a comunhão do Espírito Santo, Espírito de verdade e santificação, sejam com todos vós, agora e sempre. Amém.
O Sínodo, reunido na cidade de São Paulo, vos envia cordiais saudações e vem expor-vos os fatos que ultimamente se deram em seu seio, apesar dos esforços empregados para manter a paz e união em nossa comunidade evangélica.
As discussões mantidas, durante quase cinco anos, deram em resultado a triste separação de sete ministros e nove presbíteros regentes deste Concílio. Como sabeis, irmãos, três foram as questões principais ventiladas e discutidas: 1ª – a relação dos missionários com os nossos concílios; 2ª – a compatibilidade da maçonaria com o evangelho; 3ª – a reorganização do Seminário.
Quanto à questão dos missionários, depois de cuidadosa e fraternalmente discutida, o Sínodo resolveu manter as relações efetivas daqueles irmãos com os nossos concílios, verificando-se a seguinte maioria em votação nominal: cinquenta e três membros votaram a favor e nove votaram contra, havendo os irmãos missionários se abstido de tomar parte no pleito.
Quanto à questão maçônica, recordamo-vos, em primeiro lugar, a decisão do Sínodo em sua reunião passada: “Os Símbolos e o Livro de Ordem nada dizem a respeito da maçonaria ou de qualquer outra sociedade secreta e, portanto, é permitido a um membro da igreja ser maçom se a sua própria consciência não o proíbe; mas o Sínodo não o julga necessário. O Sínodo reconhece o direito de cada membro ter a sua opinião a respeito, mas julga prejudicial à causa do evangelho qualquer propaganda pró ou contra a maçonaria, no seio da Igreja” (vide Atas de 1900, pág. 19).
Apesar desta resolução tão prudente quão consoante à caridade cristã e em plena harmonia com a nossa “Confissão de Fé”, a questão maçônica continuou a ser discutida e o Presbitério de Minas fez subir a este Sínodo o seguinte pedido: “Ao Sínodo do Brasil – O Presbitério de Minas comunica ao Sínodo que foi aprovada a seguinte proposta: Proponho que este Presbitério, profundamente convencido da incompatibilidade existente entre a maçonaria e a Igreja, represente ao Sínodo para que ele reconsidere o seu ato da reunião passada e declare oficialmente essa incompatibilidade. F. A. Rodrigues, S.P.”
Sobre tal pedido, o Sínodo, depois de o discutir por mais de dois dias, dando máxima liberdade aos oradores, adotou, por cinquenta e três votos contra dezessete, a seguinte resolução: “Considerando o gênio do protestantismo, que está baseado sobre o direito e o dever do livre exame e a plena liberdade de consciência; considerando mais a história e as tradições do presbiterianismo, que insistem nas coisas essenciais do Evangelho e dão plena liberdade nas secundárias; considerando finalmente que não devemos estabelecer incompatibilidades na vida cristã que a Palavra de Deus não estabelece, resolva-se que se reconsidere a deliberação de há três anos e que se emita o seguinte parecer: O Sínodo julga inconveniente legislar sobre o assunto. Considerando, porém, as contendas acerbas que se têm levantado sobre a questão, o Sínodo recomenda aos crentes de uma e outra parte que nutram sentimentos de caridade cristã uns para com os outros, lembrando-se das palavras da Escritura em Romanos 14.1-13, e que seja inserto nas atas o seguinte pedido da minoria: Nós, abaixo-assinados, ministros e presbíteros membros deste Sínodo, convencidos da incompatibilidade da maçonaria com o Evangelho, vimos pedir aos ministros e presbíteros maçons que, pela paz e pela união em Cristo, deixem a maçonaria e que o Sínodo nos reconheça a liberdade de externar os nossos pensamentos sobre o assunto” (com 16 assinaturas).
Conhecido que foi o resultado desta votação nominal, retiraram-se do recinto dezesseis irmãos que contra ela haviam votado, declarando alguns deles que se desligavam da Igreja Presbiteriana no Brasil.
Como vedes, irmãos, se isto aconteceu não foi porque este Sínodo se tivesse pronunciado em favor da maçonaria, nem tão pouco porque ele aprovasse alguma doutrina herética, como seja a negação da necessária mediação de nosso Senhor Jesus Cristo, como alguns nos querem imputar, pois jamais este Sínodo deixou de reconhecer, crer e ensinar esta doutrina fundamental do cristianismo, mas porque os irmãos dissidentes insistiam em que a nossa igreja se pronunciasse contra a maçonaria e lhes conferisse a liberdade de continuarem a polêmica conta a dita ordem.
A decisão deste Concílio não podia ser outra pelas razões seguintes:
1ª Ficou demonstrado que a maçonaria não é religião nem deve ser considerada como tal. A sua linguagem e o seu simbolismo não devem ser, portanto, interpretados teologicamente.
2ª Os irmãos maçons declaram terminantemente que, sendo um dos princípios básicos de dita ordem a plena liberdade de pensamento e consciência, a solidariedade maçônica não importa a aprovação de quaisquer doutrinas ou atos anti-evangélicos, de quaisquer opiniões falsas em filosofia ou ciências, quer individuais, que coletivas, do mesmo modo que a nossa solidariedade cristã com a Aliança Evangélica não significa aprovação de tudo quanto for escrito ou sancionado pelas igrejas irmãs.
3ª Porque a Igreja não pode absolutamente exigir como condição de admissão e gozo de seus privilégios senão aquilo que é exigido pela Palavra de Deus, interpretada pelos nossos Símbolos de Fé. Isto é essencial e necessário. As demais opiniões são secundárias e, por isso, o Sínodo as deixa à consciência esclarecida dos irmãos.
4ª Proceder de outro modo seria, além de tudo isto, abandonarmos os princípios básicos do protestantismo: o livre exame, a plena liberdade de consciência, e retrocedermos aos princípios medievais. Seria esquecermo-nos das tradições gloriosas do Presbiterianismo, que tanto tem pugnado pela liberdade de pensamento e que tanto tem sofrido em defesa da liberdade cristã.
5ª Se o Sínodo declarasse a maçonaria incompatível com o evangelho, colocar-se-ia em desarmonia com as outras igrejas evangélicas do Brasil e em todo o mundo, não podendo manter com elas plena comunhão, dar ou receber cartas demissórias, pois que elas não reconhecem tal incompatibilidade.
6ª Tal resolução importaria na violação dos votos de fidelidade à Confissão de Fé: “Deus só é o Senhor da consciência, que ele deixou livre de doutrinas e mandamentos humanos de qualquer modo contrários à sua Palavra ou estranhos a ela em matéria de fé e culto. É uma traição à liberdade de consciência crer em tais doutrinas ou obedecer a tais mandamentos, a despeito da consciência. Destrói a liberdade de consciência e também a razão o exigir fé implícita e obediência absoluta e cega” (vide Confissão de Fé, XX, Art. 2º).
Apesar de todos os seus esforços, o Sínodo viu realizar-se a deplorável divisão. Não lhe teria sido possível evitá-la sem ofender os princípios fundamentais do cristianismo.
Cumpre-vos, porém, continuardes a reconhecer como nossos irmãos na fé e amados em Cristo aqueles com os quais, não obstante a sua separação, o Sínodo continua a manter relações fraternais.
Oremos, caros irmãos, para que nós e eles, na gloriosa esperança dos filhos de Deus, unidos e fortes, nos empenhemos na prática das virtudes cristãs e na evangelização do nosso estremecido Brasil.
J. R. de Carvalho Braga – moderador
J. Zacarias de Miranda – vice-moderador
E. de Carvalho Braga – 1º secretário
Matatias Gomes dos Santos – 2º secretário
N.B. Esta pastoral representa a opinião unânime do Sínodo.
Adotou, ainda, unanimemente a seguinte resolução:
Tendo chegado aos ouvidos do Sínodo que se propala em diversos lugares haver neste concílio membros que ensinam poder o cristão chegar-se a Deus sem a mediação de Cristo, o Sínodo aproveita a ocasião para frisar os seguintes parágrafos da nossa Confissão de Fé e catecismos:
“O Filho de Deus, a segunda pessoa da Trindade, é propriamente Deus e propriamente homem e entretanto um Cristo – o único mediador entre Deus e o homem”. Confissão de Fé, 8, § 2.
“O único mediador do pacto da graça é o Senhor Jesus Cristo”. Catecismo Maior, Pergunta 36.
“Oração é um santo oferecimento de nossos desejos a Deus, por coisas conformes com a sua vontade, em nome de Cristo, com a confissão de nossos pecados e um agradecido reconhecimento de suas misericórdias”.
O Sínodo declara que este é o seu ensino e que não permitiu nem permitirá que membro algum do Sínodo ensine o contrário.
São Paulo, 6 de agosto de 1903.
J. R. Carvalho Braga, moderador
E. de Carvalho Braga, 1º secretário
(Fonte: Revista das Missões Nacionais, 15 de agosto de 1903, p. 1-2)